
Quando a grande mídia, ao perceber que não conseguiria conter
as manifestações de rua (pois ela detém a maior bomba de efeito moral do
Brasil), tentou manipulá-la. Tentou impor pautas de reivindicações
conservadoras do ponto de vista social e diluir as reivindicações por transporte
público. Mais uma vez não conseguiu. As pessoas que estão nas ruas, começam a
relativizar as verdades transmitidas por jornais, TV´s e revistas.
A classe política, da que está no poder às que não estão, - da
União, Estados e Municípios - da esquerda à direita, ficou perplexa com o que
ouviu nas ruas. Uma fala emblemática do líder do governo Dilma, Romero Jucá,
deixa isso claro: “É, sabíamos que havia um descompasso entre nós e a
população, mas não imaginávamos que era tão grande”. Pois é senador, é um
abismo.
A presidente Dilma, acuada pelas manifestações, conclamou o
poder executivo de todo o país – todos os governadores e prefeitos de capitais –
e fez um importante anúncio. Dilma foi obrigada a isso, pois, seus atuais
aliados, também estavam na berlinda, de maneira habilidosa, a presidenta tentou
jogar-se nos braços do povo, e jogou a decisão ao Congresso Nacional, sugerindo
uma Assembleia Nacional Constituinte exclusiva para a reforma política.
É NECESSÁRIA UMA REFORMA POLÍTICA?
O que ocorreu nas ruas do Brasil foi um grito. Um grito importante
e que ecoará por muito tempo e que fez as estruturas de poder no país tremerem.
Mas não sabemos qual será o fôlego das ruas. Além de vitórias pontuais, é
necessário que esse estremecimento sirva para começar a florescer uma proposta
consistente de reforma política, que, aliás, é muito mais profunda e ampla que
uma reforma eleitoral como tem sido proposta. Uma reforma política que possa,
ainda mais do que a Constituição de 1988, avançar numa democracia participativa,
com transparência e controle social. Uma reforma política que vá além da,
necessária, reforma eleitoral, que altere as estruturas de participação da
sociedade em todos os níveis, que fortaleça conselhos municipais, que garanta
transparência na gestão pública, que exija políticas públicas claras e
eficientes dos governantes, que acabe com a promiscuidade entre poderes legislativos
e executivos. Uma reforma política que garanta o controle social do judiciário.
PLEBISCITO OU REFERENDO?
Fica claro que os donos do poder, via grande mídia, querem,
mais uma vez, frear o ímpeto das ruas. Começam a dizer que uma consulta pública
custaria muito caro, que não há tempo, que isso é uma matéria muito complexa e
outros falatórios preconceituosos e arrogantes. Esquecem que, quem mudou (e
está mudando) esse país não são eles, é o povo na rua.
A grande mídia tem defendido que a reforma política fique
num referendo. Em um referendo, a população irá às urnas par
a aceitar ou
rejeitar a reforma política feita pelos atuais parlamentares. Se rejeitarem,
volta tudo como é hoje. Bacana, não? Isso é o que os intelectuais que têm
espaço nas TV´s e nos jornais têm defendido.
Em um plebiscito a população pode escolher entre algumas
opções. O que o governo Dilma tem defendido é uma reforma eleitoral (chamando-a
de reforma política). Tudo bem, ela é melhor que um referendo. Porém, a pergunta
que fica no ar é: que perguntas serão feitas? Como serão feitas? Quem as fará?
Será que os atuais parlamentares têm legitimidade e condições para fazerem
isso? Parece-me que não.
Ao que me parece, o mais adequado neste momento, é um
plebiscito que faça perguntas como as seguintes:
- Você é a favor de uma assembleia nacional constituinte
exclusiva para que a mesma faça uma reforma política?
A ideia é que novos representantes do povo possam discutir,
debater e aprovar um novo texto que dê novos mecanismos políticos no Brasil.
Isso é uma tarefa intrincada, longa e que exige muito trabalho.
- Você é a favor de que os deputados constituintes fiquem
inelegíveis por 8 anos?
A ideia é que os deputados constituintes não legislem à seu
favor.
- Você é a favor de que pessoas que não sejam filiadas a
partidos políticos possam se candidatar?
A ideia não exclui os partidos, mas dá a possibilidade que
personalidades, representantes populares, possam estar presentes. Além de
atender uma reivindicação das ruas.
- Você é a favor que nas eleições para deputados
constituintes não haja financiamento de campanhas eleitorais por empresas?
Para que se garanta equilíbrio e justiça nas campanhas
eleitorais que não poderão contar com estruturas milionárias.
O QUE É UMA ASSEMBLEIA NACIONAL CONSTITUINTE?
Nossa constituição é de 1988. Neste período o Brasil saia de
uma ditadura civil-militar. As manifestações populares, os movimentos sociais
estavam fortes e presentes nas ruas. Isso foi decisivo para que tivéssemos uma
boa Constituição, progressista e que garante diversos direitos individuais e
sociais.
Nenhuma constituição é suicida. Ou seja, ela não prevê
mecanismos para se acabar com ela. Novas constituições se dão em momentos de
rupturas políticas e revoluções. Uma constituição é feita por uma assembleia
constituinte. São eleitos deputados constituintes que têm a única função
discutir, escrever e aprovar uma constituição. Quando isso termina seu mandato
se encerra.
MAS ISSO ESTÁ DENTRO DA LEI?
Nossa Constituição assim determina:
Art. 1º, parágrafo único: TODO O PODER EMANA DO POVO, que o exerce por meio de representantes eleitos ou DIRETAMENTE, nos termos desta Constituição.
Art. 14. A SOBERANIA POPULAR será exercida pelo sufrágio universal e pelo voto direto e secreto, com valor igual para todos, e, nos termos da lei, mediante:
I - plebiscito;
Art. 49. É da competência exclusiva do Congresso Nacional:
XV - autorizar referendo e convocar plebiscito
Assim, se o povo votar em um plebiscito e nele autorizar uma
assembleia nacional constituinte exclusiva, isso será plenamente possível e
legal. A única exigência é que o Congresso Nacional convoque esse plebiscito e
faça as perguntas corretas.
Atualmente a Constituição só pode ser alterada por meio de
Emendas Constitucionais propostas por deputados ou senadores. Assim a
constituinte exclusiva substituiria os parlamentares.
MAS ISSO É IMPOSSÍVEL DE ACONTECER
Segundo pesquisa Datafolha, 8 em cada 10 brasileiros apoiam
as manifestações. A mesma pesquisa mostra que 73% aprovam a elaboração de
reforma política por um grupo de representantes eleitos. A hora é essa.
As ruas demonstraram que muita coisa que era impossível na
política brasileira aconteceu. As ruas podem muito. Nós temos que mantê-las
ocupadas e unidas em torno de objetivos comuns.
Avante!
Rafael Moya