Sustentabilidade, Desenvolvimento Socioambiental, Política, Direitos Humanos, Justiça. "Voe como uma borboleta, ferroe como uma abelha." (Muhammad Ali)
28 abril 2012
19 abril 2012
O Valor do "Nada"
Artigo publicado no Jornal Correio Popular em 19 de abril de 2012.
Rafael Moya
O VALOR DO “NADA”

Nosso primeiro ímpeto
quando vemos uma área sem construção feita pelo homem é dizer que naquele local
não há nada. Segundo o professor José Francisco, da Faculdade de Engenharia Civil
da Universidade Federal de São Carlos: “A desconstrução da paisagem, talvez
pela arrogância de quem a planeja, leva-nos à sensação de que, em alguns casos,
os espaços estejam vazios. O espaço/paisagem como espaço vazio é uso político
do espaço. Enquanto figura política, como não poderia deixar de ser, o vazio
apresenta prós e contras. Ele pode representar um ônus para a sociedade ou
significar uma reserva estratégica de terrenos suscetíveis de receber usos
novos face às necessidades de uma demanda futura. A falta de área disponível,
então, numa dada localidade pode ser respondida, em tese, com uma nova
utilização ao lado ou próxima, fazendo-se uso do vazio do entorno.”
Áreas verdes, ou
“vazias”, cumprem diversas funções. Uma delas é realizar o controle da ocupação
de uma determinada região, evitando assim, excessivo adensamento e seu
conseqüente aumento do trânsito – em uma sociedade cada vez mais pautada pelo
transporte motorizado individual. Outra função é controlar as enchentes com a
absorção de água. Caso esta área “vazia” esteja arborizada, poderemos contar
ainda com significativa melhora na qualidade do ar e da temperatura. Quanto à
água, muitas destas desconstruções de áreas “vazias” ocorrem nas chamadas áreas
de recarga, dificultado, ou até mesmo impedindo, que a água de chuva seja
absorvida pelo solo levando-a até o lençol freático.
Dramaticamente, noto que
grande parte do nosso pensamento político e econômico ainda insiste em ser a
vanguarda do atraso. Percebemos que o tão almejado desenvolvimento é medíocre
em seu alcance socioambiental. Na busca pela moeda de hoje, queimamos o tesouro
de amanhã. É evidente que a preservação ambiental incorre em gastos ou ao menos
reduz potencialidades de ganhos individuais ou de pequenos grupos. Mas se
fizermos a contabilidade ambiental em nossas políticas – pensando no médio e
longo prazo e de maneira mais republicana –, certamente concluiremos que vale a
pena preservar e utilizar estas áreas de maneira sustentável.
Tratar a Serra dos
Cocais como um entrave ao “desenvolvimento”, se não for um atentado à
inteligência média, é um crime ambiental. Isto também se aplica à nossas
praças, bosques e parques e grandes áreas públicas. Se não houver uma política
pública séria, não apenas de preservação intocável, mas também de uso econômico
e social sustentável, repetiremos os erros de outras nações. Estamos perdendo a
possibilidade de mantermos um dos principais diferenciais do Brasil que são os
recursos naturais.
Para toda ação há uma
reação. Ao atuarmos na flexibilização de leis ambientais, não respeitarmos a
legislação existente, não garantirmos condições dos órgãos de controle atuarem,
permitirmos o crescimento desordenado, construímos o caos e perdemos
oportunidades. Ao abrirmos mão de mantermos e respeitarmos as áreas rurais de
grandes cidades, nossos parques e praças, como temos visto em Campinas, em nome
de uma superioridade econômica do concreto e do asfalto em relação a figos e
goiabas, também daremos nossa contribuição à escassez de água. O futuro
pertencerá àqueles que conseguirem que a dinâmica política e econômica esteja
em função da qualidade de vida das pessoas e isso passa diretamente por
pensarmos de maneira mais grandiosa do que temos visto. A sustentabilidade tem
que sair do marketing e ir para a prática.
“O que dá valor a uma
xícara de barro é o espaço vazio que há entre suas paredes.” (Lao-Tse)
Rafael Moya, advogado,
mestrando em Engenharia Urbana, e Presidente do Conselho Municipal de Meio
Ambiente de Campinas (COMDEMA)
Assinar:
Postagens (Atom)