13 maio 2011

Sintoma do urbanismo brasileiro

Excelente artigo sobre o dano que a elite brasileira causa ao país.

Rafael Moya

Por Walter Hupsel . 12.05.11 - 16h01

Pobre São Paulo, Pobre Brasil!

“Elite”, ah a elite. Palavra deturpada no Brasil, pejorativa, carregada de sentido negativo. E há um grande culpado nesta história: ela própria, a nossa elite tacanha, umbigada, que luta pela manutenção dos seus enormes privilégios. E mais um exemplo desta mentalidade tacanha foi-nos ofertado quando a Associação de Moradores de Higienópolis, bairro charmoso de São Paulo, fez um abaixoassinado para evitar que uma estação de metrô fosse construída nas imediações da Avenida Angélica.
Não se sabe se foi este abaixoassinado que fez com que o Governo do Estado mudasse os planos, ou se foi o caráter “técnico” alegado, mas o fato é que 3.500 habitantes de Higienópolis se recusaram a aceitar o metrô alegando que traria “gente diferenciada”, leia-se, pessoas em trânsito, pobres, ou pelo menos não tão ricos.
Há, no mínimo, três aspectos a considerar: um, é óbvio, o preconceito. O outro, como consequência, o insulamento da nossa elite, e também derivado, a idéia privatista de sociedade.
A expressão usada por uma psicóloga, “gente diferenciada”, já denota o caráter preconceituoso e demofóbico da recusa. A nossa elite não quer ver o outro, o diferente, exceto serviçais cônscios do seu lugar, o elevador de serviço e de cabeça baixa.
No mesmo bairro, o mesmo protesto anos atrás por conta da construção de um shopping. Ia trazer esta gente estranha, diferente. Hoje adoram o shopping e a falta de “lojas populares” foi um dos argumentos para esta mudança de avaliação.
Velha tática da avestruz. Se o que vejo não me agrada, enfio minha cabeça num buraco para que não o enxergue mais. Blindo meu carro, construo muros físicos e simbólicos e frequento lugares que os outros não podem. (Já escrevi sobre isso, “Ilha cercada de Realidade“, quando a os bárbaros insistem em desmascarar a vida murada).
Isolada, sem projeto de nação exceto a manutenção da segregação e dos próprios privilégios, a nossa elite que já foi dirigente hoje se encastela na sua vidinha e tenta, a todo custo, impedir outros de se aproximarem. Estes 3.500 signatários são os mesmos que aplaudem a bravata do ex-comentarista da RBS, Luiz Carlos Prates e o mimimi de Luiz Pondé, ao escancarar as portas do preconceito da nova classe média que tem agora acesso ao bem mais intangível que separava as classes: o avião. Uma papo em nada diferente eu mesmo ouvi num vôo da Avianca.
Estes se acham no direito de tentar evitar que outras pessoas, diferentes, cheguem ao bairro charmoso. Pensam na sua bela Higienópolis como uma cidadela a ser defendida, contra São Paulo.
Em nenhum mísero instante passou na cabeça deles a malha de transportes públicos, o impacto de um metrô, não só pros seus usuários mas também pra tirar carros das ruas, tirar gente dos ônibus superlotados, e prover um mínimo de conforto. Um bem público, enfim.
Não lembram eles que o metrô é para a cidade, para quem precisa se deslocar por ela, mesmo que seja para vestir um uniforme e assumir a portaria do seu belo e suntuoso prédio.
Como disse brilhantemente o Paulo Moreira Leite,  “Eu acho que a degradação de um bairro — de uma cidade, de um país — começa quando aqueles que têm muito são incapazes de compreender as necessidades de quem tem muito menos”. O exemplo do metrô nos joga na cara o quanto somos degradados, o quanto esta elite se perdeu em algum lugar, entre a nação e seu próprio umbigo.

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