04 março 2011

Reforma política: DURO GOLPE NA DEMOCRACIA


Artigo de minha autoria publicado no jornal Correio Popular de 04 de março, sobre um dos pontos da Reforma Política.


DURO GOLPE NA DEMOCRACIA

Os cidadãos brasileiros são chamados, a cada dois anos, a participarem de um jogo em que não sabem as regras. É comum ao conversarmos sobre política ouvirmos que as pessoas não votam em partidos mas em pessoas. Esta percepção de que o eleitor pode ficar imune ao partido é falsa e leva a distorções. Interessante seria uma pesquisa que nos revelasse quantos eleitores sabem a diferença entre eleições proporcionais e majoritárias, ou ainda, o que significa quociente eleitoral.
Na proposta da votação em lista fechada, o eleitor não teria mais o direito de votar na pessoa do candidato, pois teria que votar apenas em um partido. Ao final da eleição, a lista não poderia ser alterada, tendo-se que se respeitar a ordem definida pelo partido em discussão interna. Em tese, essa nova regra deixaria as coisas mais claras ao eleitor e fortaleceria os partidos políticos. Ocorre que - assim como a atual regra já faz -  essa medida levará a brutais distorções.
Atualmente, praticamente todos os partidos políticos são controlados por burocracias partidárias quase invencíveis. Toda a estrutura partidária fica em função da burocracia que a controla. Em períodos de convenções essa burocracia utiliza-se de toda a estrutura para carregar filiados para votarem, as possibilidades de fraudes são imensas, não há um controle claro e transparente no funcionamento dos partidos.
Desta maneira, um cidadão que se filie a um partido e não tenha acesso à burocracia partidária ou que não seja afilhado político de algum de seus caciques, dificilmente será eleito, pois provavelmente ficará muito longe do topo da lista do partido, desta maneira contribuirá com seu esforço e de seus eleitores para eleger outras pessoas. A atual regra já se assemelha isso, mas ao menos há a possibilidade deste cidadão ter mais votos do que os caciques e seus afilhados e ser eleito, com o voto em lista fechada nem esta possibilidade existirá. É evidente que no atual modelo as burocracias partidárias já falam alto, definindo para onde vão os recursos partidários, quem aparecerá no tempo de TV etc. O voto em lista fechada, ainda que venha sob uma emenda constitucional, será um ataque aos direitos políticos. No artigo 14, parágrafo 3º de nossa Constituição Federal, está elencado as condições de elegibilidade, entre outras, a filiação partidária. Atualmente já temos uma limitação, pois em convenção - o partido como possui uma cota de candidaturas - escolhe quais serão os concorrentes. Com a atual proposta, além da concessão ou não da vaga, ainda haverá a escolha da ordem na lista. O que poderemos ver é que muitos cidadãos jamais serão eleitos, ainda que tenha muitos votos. 
Mais uma vez a discussão sobre a reforma política gira em torno de soluções paliativas, que nada alteram os pilares deste modelo eleitoral distorcido. Enquanto a sociedade brasileira não assumir para si a discussão de uma reforma política corajosa que altere as estruturas deste modelo, continuaremos a observar a corrosão da democracia por campanhas milionárias que pouco têm de diferente entre si e nada de propostas concretas para os reais problemas do nosso país. Testemunharemos campanhas programáticas e ideológicas serem jogadas para segundo plano por não terem potencial econômico. Esperar que o Congresso Nacional faça isso por livre e espontânea vontade é acreditar que as raposas podem cuidar do galinheiro.

Rafael Moya
Advogado, atua com Direito Eleitoral.
www.rafaelmoya.blogspot.com

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